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Como faturar vendas de produtos digitais?
Nos últimos anos têm aumentado as ofertas de produtos digitais — cursos, templates e toda uma infinidade de possibilidades à distância de um clique.
Mais do que aumentar a oferta, temos percebido que é uma oportunidade para expandir os nossos negócios sem os limites da geografia e para variarmos os nossos serviços através de ofertas facilmente escaláveis e automatizáveis.
Mas quando começamos, começam também as dúvidas no que toca à faturação e contabilidade. A primeira coisa a ter em atenção é que as leis andam devagar. Isso significa que a internet e o comércio online estão bastante mais à frente do que as regras que já estão estabelecidas e isso tende a gerar confusão. Sim, vão sendo atualizadas, inclusive estão sempre a sair novos esclarecimentos sobre a interpretação das leis fiscais, mas nós não estamos sempre em cima deles. Se nem os contabilistas estão a par de todas as atualizações sobre todas as áreas fiscais, até os comuns mortais vão sentir dificuldades.
Qual é o código a utilizar?
Para vendas online, o código que melhor representa a atividade é o 47910 - Comércio a retalho por correspondência ou via Internet. A par desse, a recomendação é que tenhas outros códigos que espelham a atividade que estás a exercer. Por exemplo, se vendes formações online, além desse código convém teres um CIRS de Formador, ou um CAE que inclua formação.
O que é importante relembrar sobre a validade dos documentos fiscais
A lógica a seguir quando vendes online deve ser sempre a mesma: se estás registado em Portugal, para que um documento fiscal (uma fatura, por exemplo) tenha validade, tem de ser comunicada às Finanças. Pondo de forma simplista, tem de ser emitida no Portal das Finanças ou num software certificado pela AT, como o Moloni.
Se as tuas vendas não são comunicadas à Autoridade Tributária, não estão oficialmente a ser consideradas rendimento. Se não é rendimento, não é sujeito a imposto, não conta para a Segurança Social e daí por diante. É, em poucas palavras, fuga ao fisco.
Por isso, quando a plataforma emite comprovativos de compra ou invoices aos clientes que estão a comprar os produtos que vendes, começa por confirmar a validade fiscal desses documentos.
Para declarar rendimentos tem de haver um documento com validade fiscal.
A quem emitir a fatura?
Há duas formas de faturar produtos digitais: a primeira é faturar os produtos um a um, ao cliente que os comprou, a segunda é emitir as faturas à plataforma onde os produtos são vendidos e que serve de intermediário à venda. A forma de faturar não é uma escolha e depende da plataforma — no Etsy ou no Hotmart, por exemplo, a fatura é emitida à plataforma; em vendas individuais ou em plataformas como o Podia, a fatura é emitida ao cliente.
Se a plataforma que usas tem uma mensalidade ou anuidade fixa, o mais provável é que a faturação seja por cliente. Se a plataforma te cobrar uma comissão e ela própria emitir faturas de cada compra, o ideal será faturares mensalmente (ou noutro período acordado). O melhor é verificares junto da plataforma como é o procedimento de faturação nesse caso.
Quem paga as comissões?
Pensa neste cenário, o teu cliente compra um curso online por 50 €. Desse valor pode sair a comissão para a plataforma onde o curso funciona, a comissão do método de pagamento e o IVA, se incluído. Todos esses valores estão a ser pagos pelo cliente e, por isso, o cliente deve receber um documento fiscal que comprove essa compra — seja do teu lado, seja do lado da plataforma.
Embora não cheguem a ti, quem está a pagar as comissões é o cliente. Para ti, elas são despesas do negócio.
São serviços ou produtos?
Muitas pessoas que começaram a vender produtos digitais consideram-nos como “vendas”, tal como produtos físicos.
No entanto, isso não está certo e, se ainda não saiu esse parecer da AT, acredito que vai sair em breve.
É que as tributações são diferentes para vendas de produtos físicos e serviços, e em regime simplificado, como é o caso da larga maioria dos trabalhadores independentes, isso significa que a Segurança Social só considera 70% dos teus serviços e 20% dos teus produtos como lucro (Novo Regime dos Trabalhadores Independentes), enquanto que para as Finanças as percentagens vão ser 75% para serviços (ou 35% para serviços não previstos na lista da tabela anexa do artigo 151º) e 15% para vendas (Artigo 31.º - Regime simplificado).
Estamos a falar na generalidade e no regime simplificado. A lógica por trás disto é que tu tens despesas no funcionamento do teu negócio e, quando vendes produtos físicos, uma vez que tens de os comprar, ou comprar as matérias primas para os fazeres, as tuas despesas vão ser maiores. Os produtos físicos, como os serviços de hotelaria, por exemplo, são menos considerados e isso vai significar menos imposto.
Os teus produtos digitais não são representativos da realidade das vendas de “produtos físicos” e, por isso, o mais correto é considerá-los serviços.
A economia digital está sempre em constante crescimento, há muita variedade de serviços e bens a serem trocados digitalmente e isso faz com que este artigo, dada a sua validade no tempo, tenha limitações. Refiro-me aqui sobretudo a cursos, masterclasses, comunidades, palestras e outros semelhantes, mesmo que sejam cursos "em pacote", pré-gravados.
A melhor recomendação que posso deixar é que, se este artigo não parece fazer sentido para o tipo de produto digital que vendes, aconselha-te com um contabilista, preferencialmente alguém que esteja informado sobre essa área da contabilidade.
Mais informações sobre o projeto da Sofia Rocha e Silva:
https://luscofia.com/