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Pandemia e Empreendedorismo: sentença ou desafio?

Publicado a 03-09-2020

Em tempos de incerteza, os empreendedores devem fazer aquilo que sabem fazer melhor: inovação e como monetizá-la. No entanto, há condições que devem ser observadas para que a atividade não seja uma sentença.

Pandemia e Empreendedorismo - Imagem Blog

Os efeitos do SARS-CoV-2 (COVID 19) fazem-se sentir por estes dias a nível global. Ainda que intensamente estudado, o vírus causador da pandemia mundial não tem por enquanto cura anunciada e mesmo as vacinas anunciadas são um grande ponto de interrogação quanto aos contextos em que proporcionam proteção contra o vírus e contra os seus sintomas.

O crescimento de casos assintomáticos remete para o algoritmo de regras de testagem desenvolvido pelas entidades de saúde nacionais e supranacionais a descoberta de novos casos e a correspondente aplicação de medidas profiláticas de isolamento e proteção individuais, mesmo que os indivíduos não revelem sintomas das doenças associadas.

Aqui chegados, importa dizer que os piores cenários de mortalidade não se verificaram, não porque o vírus tenha sido mal avaliado, mas porque, globalmente, as pessoas mudaram comportamentos e adaptaram-se a novas realidades. Muito poucos exemplos serão mais representativos da mudança de hábitos atrás referida do que as alterações introduzidas no modelo de ensino que foi aplicado no último trimestre do ano letivo 2019-2020 que mudou radicalmente o espaço de aprendizagem e passou a estar exclusivamente assente nas novas tecnologias de informação e comunicação. Não sendo “escola”, a transmissão de conhecimentos foi atingida e igualmente ou mais importante ainda foi medida. 

Além das consequências sanitárias causadas por esta doença, devemos dar também especial relevo às consequências económicas que se fazem sentir em todos os operadores e agentes económicos. Se nalguns casos as consequências são positivas (distribuição, alimentos pré preparados e transporte de refeições) na sua larga maioria as consequências são negativas e ameaçam a sobrevivência de grandes empresas com papéis de extrema relevância nos sistemas económicos nacionais como é o caso das companhias de aviação que, durante praticamente um semestre, viram a sua operação suspensa ou extremamente reduzida a serviços de transporte de emergência, quer de pessoas quer de materiais. As empresas foram forçadas a uma análise rápida das mudanças de comportamentos e das novas opções de consumo.

Assim, para empresas já estabelecidas no mercado passaram a ser mais significativas as tendências de produtos essenciais como comida embalada, produtos de higienização de superfícies e produtos de higiene pessoal. No outro prato da balança estiveram os cuidados pessoais, a alimentação em restaurantes, o cinema e outras formas de entretenimento.

Caso o trabalho remoto, por exemplo, se transforme numa tendência mais permanente as empresas destes produtos e serviços terão que pensar seriamente as suas ofertas comerciais no que diz respeitos aos seus posicionamentos de mercado, às margens de comercialização e de contribuição de cada um deles e mesmo à integração de produtos aumentados em que os produtos até agora comercializados passam a fazer parte de outras ofertas mais adequadas ao momento de consumo atual. 

Para os empreendedores e/ou microempresários que estejam recentemente no mercado as novas tendências de consumo podem obrigar a reformulação e reorientação dos respetivos negócios como forma de sobrevivência mas também como forma de aproveitar novas oportunidades que possam surgir como a entrega sem contacto de refeições, as entregas de compras sem entrar em loja ou os restaurantes e cafés que passaram a incluir os serviços de esplanada para fomentar as boas práticas de distanciamento social.

Assim, se procura um novo produto/serviço para aplicar as suas competências empreendedoras e empresariais atente nas seguintes considerações:

  • Verifique se as necessidades identificadas prevalecerão para além da pandemia - Os mercados de curto/médio prazo poderão não ser atrativos já que num contexto de recessão global (Austrália, União Europeia e Estados Unidos prevêem mínimos económicos que podem chegar aos 30 anos) apostar em negócios que necessitem de grandes margens de contribuição para serem rentáveis é uma aposta que se pode revelar ruinosa, além de moralmente questionável. Por outro lado, os picos de fornecimentos de emergência (máscaras, soluções desinfetantes e outros equipamentos de proteção individual) estão a ser assegurados por readaptações de estruturas produtivas já existentes e de forma gratuita ou suportada por doações e fundos públicos, o que inviesa ou impossibilita mesmo que iniciativas empresariais possam vingar a fazer as mesmas coisas;
  • Analise a evolução dos mercados em que pretende atuar - Caso não tenha uma correspondência exata ao seu modelo de negócio identifique um modelo que lhe for próximo, para que possa estabelecer e registar os principais marcos de evolução desse negócio num espaço temporal de 5 anos e, de preferência, não inclua nesta análise dados pandémicos para que a análise verse sobre um mercado que funcione com um mínimo de condicionantes.
  • Utilize ferramentas de comunicação específicas e dedicadas às suas novas ofertas - E de preferência gratuitas. Há recursos cujo contributo é inestimável já que chegam a vastas audiências com um máximo de especificação aos segmentos de mercado que sobre os quais pretende atuar. 
  • Não negligencie oportunidades de mercado decorrentes da pandemia - Oportunidades de crédito, moratórias de pagamento, redefinição de centralidades baseada na reorganização de espaços decorrentes das necessidades de distanciamento, etc.. Estes e outros exemplos de facilitadores, que são conjunturais, podem significar a diferença a sobrevivência e o encerramento de muitas atividades durante o período em que os indicadores económicos ainda caminham para o regresso à normalidade;
  • Estabeleça planos de contingência - No contexto económico que vivenciamos, a definição e registo de caminhos alternativos é um procedimento obrigatório. Pelo menos, depois das restrições económicas, todas as empresas terão que se adaptar a um novo normal. Só aí poderá ser verificada a tenacidade das novas tendências de consumo e os hábitos que prevalecem sobre as condicionantes impostas por razões sanitárias.
  • Crie novas formas de contacto e acompanhamento dos clientes - Em tempos de incerteza, manifestar juntos dos seus clientes a disponibilidade para os acompanhar na mudança e incorporar no seu produto/serviço as mais recentes alteração do mercado pode fazer toda a diferença. Manter uma relação de confiança e proximidade com os seus clientes mesmo em tempos de adversidade é um estímulo e uma motivação adicional para que os seus clientes mantenham um relacionamento fiel à sua empresa ao longo do tempo.

Quando o cenário pandémico terminar, muitas iniciativas empresariais terão fracassado e outras terão sobrevivido. As razões destes resultados, se em grande parte poderão ser contextuais, por outro, poderão ser explicadas pela abordagem que os empreendedores aplicaram para lidar com o COVID e as respostas que forneceram através dos seus produtos e/ou serviços. 

As lições que se tiram do empreendedorismo são fortemente alicerçadas no estudo dos exemplos mais bem sucedidos como forma de ajudar os menos afortunados. No entanto, à sombra de uma pandemia em que todos são afetados negativamente (obviamente alguns mais do que outros), deverão ser estudados com igual relevo os falhanços, quanto mais retumbantes, melhor, através do nexo causa-efeito para que se possam evitar as razões pelas quais determinadas iniciativas não correram bem e identificarem os mecanismos empresariais que se equilibrem em torno de um futuro novo e melhor e na construção da resiliência empresarial. 

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